sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Queridinha

A pergunta foi simples e direta, resultado de uma conversa boba sobre comportamento: - E o Sr. T? Como ele chamava você? Estávamos conversando sobre como os casais se tratam, rindo dos apelidos ridículos que colocamos em nossa cara-metade quando estamos apaixonados, como Mô, Mor, Benhê etc. Acessei a memória buscando a resposta. Não encontrei de imediato. Procurei a memória auditiva de quando ele me chamava para alguma coisa. Sabia que ele me chamava de Ana, mas muito raramente... Como ele me chamava, meu Deus! Qual era o nosso tratamento? Tentei visualizar a cena do Sr. T entrando pela porta e caminhando em minha direção enquanto dizia alguma coisa. A dor foi inevitável. O fluxo de imagens reavivadas na memória é sempre doloroso... Eu conseguia reproduzir as imagens, mas não podia ouvir. Eu não conseguia lembrar! Pânico... Comecei a suar frio enquanto o meu coração dava pinotes. Como eu podia não lembrar! Como? Senti um nó na garganta, os olhos arderam com uma vontade enorme de chorar. Levantei da cama agitada e fui em direção ao quarto da filha mais velha:

- Filha, você se lembra de como o Sr. T me chamava? Ela me olhou espantada, pensou por alguns segundos e começou a descrever:

- Ele a chamava de Ana, nunca usou Bia ou Ana Beatriz. Chamava de "meu bem" e quando explicava alguma coisa para você dizia "minha querida". Quase o tempo todo dizia "queridinha"...

Isso! Queridinha... Ou minha querida... Sentei na cama aliviada. Isso! Pude visualizar novamente a imagem dele em várias situações me perguntando coisas ou me chamando. - Mas é claro, minha querida! Quer que eu faça isso, queridinha? Meu Deus, consegui lembrar! Quando eu resolvi escrever esse blog foi justamente para não esquecer as pequenas coisas do nosso cotidiano porque quando a dor é muito grande, o mecanismo de defesa do corpo (e da alma) apaga as imagens, as experiências e os sons da nossa memória. O registro de cada lembrança minha aqui no blog sempre me faz chorar, é inevitável. Mesmo assim, depois de mais de cem postagens, ainda assim, não foi o suficiente. Eu esqueci de algo básico e essencial: o carinho enorme com o qual o Sr. T me tratava!

Nenhum comentário:

Postar um comentário