domingo, 29 de agosto de 2010

Os filhos do Sr. T

Eu já falei aqui de Dona Mariazinha, proprietária da nossa família, mas o Sr. T tinha outros dois filhos já adultos e uma netinha. Isso significa que Mariazinha é tia de uma menina fofucha, poucos anos mais nova do que ela. Tia e sobrinha brincam de massinha e de boneca juntas! Esqueçam tudo sobre as histórias de conflitos familiares edipianos e disputas de novela, os filhos do Sr. T são as criaturas mais doces e boas que eu já conheci na vida. Se a minha vida financeira fosse folgada, daria para eles tudo o que daria para as minhas filhas, sem pensar duas vezes. Na nova organização do meu cotidiano, tenho contado com eles para cuidar de Mariazinha, já que a opção de um transporte escolar agora seria complicada demais. A tarefa de levar e buscar Mariazinha na escola era do Sr. T e, justamente por isso, estamos fazendo um esforço concentrado para que ela não se sinta abandonada. Sexta-feira, ela chegou com dois jogos novos que ganhou do irmão e resolvi colocar um pouco de ordem na casa: - Filha, você não pode ficar pedindo para seu irmão comprar jogos e levar você para passear o tempo todo. Não está certo! Ela me olhou e disse muito séria: - Mas eu não pedi, mamãe! É que ele sabe tudo o que eu gosto e eu nem mando ele fazer nada, mas meu coração fica muuuuito feliz, sabe? Na mesma hora percebi que ela já tinha encontrado um substituto para fazer de gato e sapato...

sábado, 28 de agosto de 2010

Brilho eterno de uma mente sem lembranças

Ontem, ao folhear a minha tese com uma aluna, me deparei com a folha de agradecimentos: "ao meu companheiro, Sr. T, que me fez pular de mais uma ponte em nossa caminhada", não pude evitar as lágrimas e fiquei com raiva de mim mesma. Afinal, até quando eu vou ter líquido suficiente para continuar chorando? Pensei em como seria bom apagar aqueles momentos terríveis da minha memória e lembrei do filme Brilho eterno de uma mente sem lembranças. Racionalizando melhor a minha angústia, percebi que para apagar os momentos ruins, eu teria que esquecer também as coisas boas. Eu estaria disposta a esquecer toda a minha história com o Sr. T para superar a minha tristeza agora? A resposta é não, por uma razão simples: as pessoas que são importantes em nossa vida tem um papel tão essencial que tornam-se uma parte de nós mesmos. Eu sou o que sou hoje porque uma parte do Sr. T está under my skin, na minha própria pele. É interessante como as pessoas próximas sentem a necessidade de completar a lacuna, você ainda é jovem, vai encontrar alguém, será feliz novamente...Pessoas não são como um vaso quebrado ou como um emprego que você troca e está tudo resolvido. Não sofro com a perda da figura do marido provedor e protetor, até porque o Sr. T nunca desempenhou esse papel. Sinto falta apenas dele ser... Quem diz que o sofrimento traz algo de positivo, está mentindo, nós não nos tornamos melhores porque sofremos (isso faz parte do pensamento cristão) e a morte não traz absolutamente nada de positivo. Apenas faz parte da nossa história.

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

O maníaco da lanterna

Há alguns anos o Sr. T trabalhava para um grande projeto de inclusão digital do Governo Federal, o que o obrigava a viajar constantemente para Natal. Ele costumava voltar à noite e sempre reclamava que enxergava pouco por causa dos farois dos outros carros. Na verdade, o Sr. T tinha catarata que foi diagnosticada mais tarde. Enquanto ele não ia ao oftalmologista, continuava acreditando que tinha apenas uma sensibilidade aos farois. Certa noite, ele me liga avisando que ia demorar porque as luzes de um caminhão tinham deixado ele momentaneamente cego e o carro caiu dentro de um buraco na estrada. Pergunto se ele está bem e ele responde: - Está tudo certo, foi só o carro que quebrou a suspensão. Já estou chegando. Carro quebrado, a solução foi ligar para o seguro enviar o reboque. Horas depois, o Sr. T chega em casa todo estropiado, com os braços e o rosto arranhados e mancando. - Você não disse que não tinha se machucado? perguntei espantada, já imaginando que o Sr. T tinha mentido para não me deixar preocupada. Fazendo caretas de dor, ele responde: - E não tinha! Eu precisei olhar a placa do carro no escuro para chamar o seguro, escorreguei no barranco e rolei quase dez metros barranco abaixo! Estou todo cheio de espinhos... Fala sério, o sujeito escapa de um acidente de carro e se arrebenta todo ao cair no barranco, não parece uma piada? No dia seguinte, o Sr. T foi ao mercado de bugigangas da cidade e chegou em casa com um monte de lanternas. Ele fez questão de colocar uma no porta luvas do meu carro, outra na gaveta da cozinha, outra no armário e ainda distribuiu uma para cada pessoa da casa. E olha que eu não estou exagerando...

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

A origem e os meus sonhos

O impacto do filme A Origem na minha cabeça foi devastador, seja pelo visual primoroso ou pela complexidade da história. Absoluto! A minha relação com os sonhos sempre foi estruturante, parece que eu construo e reconstruo os meus dilemas do cotidiano durante os meus sonhos. Muito tempo depois de estar casada com o Sr. T, eu tinha sonhos angustiantes nos quais eu me via na minha casa antiga com meu ex-marido, vivendo como se nada tivesse acontecido. De repente, dentro do sonho, eu acordava e dizia: - Mas eu não vivo aqui, onde está T? O que estou fazendo aqui? O meu ex-marido respondia perplexo, - Você está louca? Você sempre viveu aqui e não conheço ninguém com esse nome! Bom, aí eu acordava de verdade, o coração saindo pela boca e o suor escorrendo pela testa. Era um sonho recorrente que trazia à tona os subterrâneos do meu subconsciente, mas não sei se poderia enquadrar um sonho desta natureza na categoria pesadelo, já que não havia monstros nem mortes. O meu maior medo durante muito tempo foi que a minha história real com o Sr. T não existisse, que tudo fosse apenas um sonho e que eu acordaria novamente naquela vida que eu odiava. Exatamente por isso o filme A Origem é tão próximo da minha realidade, não saber se estou sonhando ou não, é algo recorrente nos meus sonhos malucos. Hoje eu sonho ao contrário, que o Sr. T ainda está aqui e vai entrar pela porta a qualquer momento e eu tenho que explicar como eu tinha sonhado que ele nos deixava depois de uma crise boba de saúde. Nos meus sonhos ele sempre ri da minha história e não dá muita importância para a minha angústia. Talvez seja por isso que eu ainda não consiga me desfazer das coisas dele, e se eu estiver sonhando e ele entrar de novo pela porta? Como vou explicar que sumi com as coisas dele só porque tive um sonho catastrófico?

domingo, 22 de agosto de 2010

Almoço de domingo

Eu passei o ano passado inteirinho trabalhando os finais de semana, estudando para o concurso e terminando a tese de doutorado. Quem cozinhava grandes pratos nos finais de semana era o Sr. T e nós dois tínhamos uma história especial com a arte de cozinhar. Em nossos planos para o futuro estava um restaurante na praia de Pipa, no qual só iríamos cozinhar o que nos desse na telha (os clientes teriam que se adaptar, oras!). Ele fazia uma feijoada maravilhosa sempre preparada na véspera, já tarde da noite, e o cheiro se espalhava pelos corredores do prédio deixando os vizinhos com água na boca. Eu sempre implicava dizendo que ele contratava uma velha cozinheira para temperar o feijão porque era a melhor feijoada que eu já tinha provado na vida. Assim que voltou a trabalhar, o Sr. T fez planos para cozinhar grandes pratos nos finais de semana, aplicando toda a sua imaginação fértil nos princípios da cozinha. Com um pouco mais de sofisticação e acessórios chiques, ele seria quase um gourmet! O último prato que ele cozinhou foi uma carne de sol assada ao vinho com arroz de leite e macaxeira cozida com manteiga. Foi um dos melhores pratos que ele já fez e a prova disso foi que uma amiga da minha filha (que almoçou conosco naquele dia) contou em casa os detalhes do almoço empolgada. No dia seguinte, encontramos o pai dela na padaria e ele fez questão de perguntar a receita do nosso almoço, mesmo tendo me conhecido naquela hora. Hoje fiz uma almoço especial com uma carne que ele tinha comprado e guardado no freezer para preparar um assado especial. O almoço ficou maravilhoso e todas nós lembramos dos almoços do Sr. T. O fato é que a ausência de alguém é muito mais do que um conceito abstrato, é viver as pequenas alegrias do cotidiano sem a presença do outro.

sábado, 21 de agosto de 2010

Aniversário de Dona Mariazinha

A mocinha da foto com o Sr. T é chamada por todos nós de Mariazinha e o "dona" no título do post significa que ela manda em todos nós. Bom, comigo ela manda um pouco menos, mas com o pai era um caso perdido... Desde que ela nasceu foi um caso de amor à primeira vista, e confesso que perdi meu status na vida do Sr. T para ela. É preciso registrar que ele foi pai novamente já beirando os 50 anos, depois de ter dois filhos homens. A divisão do trabalho aqui em casa era ao contrário da sociedade convencional: nos últimos dois anos eu estava trabalhando e fazendo o doutorado enquanto o Sr. T cuidava da nossa casa e de Mariazinha. Os dois viviam juntos o tempo todo, ele conhecia todas as crianças da escola, a colocava para dormir (cantando e balançando no colo, mesmo ela já grande) e se preocupava porque ela não comia bem como ele gostaria. Mariazinha se aproveitava do pai babão, ela o chamava de papaizinha e nas brincadeiras o transformava sempre na filha ou na princesa. Ele perguntava:- Mas eu não posso ser o filho ou o príncipe? - NÃO! repondia ela brava, você é a filha e a vovó vai fazer um vestido para você! Sorte a nossa que o Sr. T não se preocupava muito com a questão de gênero... Hoje é aniversário dela, o primeiro sem a presença dele. Não vamos ter uma festa, mas fiz o bolo que ela queria, organizamos os enfeites juntas e vamos receber a família. Eu espero que o açúcar, os presentes e a presença das pessoas que amamos possa trazer conforto para ela. Acredito de verdade que o Sr. T possa estar em algum lugar bem iluminado para acompanhar como ela está crescendo e ver a carinha de felicidade da nossa filha!

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Quem estava lá

A sociedade avalia a importância de quem morreu pelo nível econômico e social das pessoas que vão ao seu enterro. É um coisa meio maluca, uma espécie de homenagem às avessas, sabe? Afinal, para quem partiu e não levou literalmente nada, do que adianta a presença do Coronel Fulano de Tal? Conhecendo bem o Sr. T, sei que para ele só importaria as pessoas invisíveis e é sobre elas que eu quero falar. Não me interessa a presença dos vereadores, dos diretores de escola, ou mesmo as coroas de flores enviadas por deputados ou pelo próprio partido. O que me impressionou de verdade foi a presença do rapaz que vendia jornal em frente a padaria e que veio me consolar dizendo que nunca se importava quando o Sr. T não comprava os jornais porque ele sempre parava para conversar com ele. Ou a presença do travesti que concorreu a vereador com o Sr. T em 1996, com um slogan hilário do qual não me recordo agora. Ou os balconistas da padaria que estavam inconsoláveis e até hoje colocam biscoitinhos no pacote de pão para agradar a nossa filha. São essas presenças que eu faço questão de registrar e me lembrar sempre.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Médico FDP

Você não sabia? Existe uma categoria chamada "médico filho da puta". Eles são especialistas em maltratar os pacientes, ignorar as queixas, os sintomas e também costumam negar socorro a quem precisa. Acredito que durante o tal juramento de Hipócrates (depois substituído pela Declaração de Genebra), os futuros médicos FDP devem murmurar qualquer coisa e fingir que estão recitando o texto correto. Na manhã em que o Sr. T. passou mal, ele pediu socorro ao vizinho que se diz médico aqui no prédio. O sujeito que pensa que é médico negou socorro alegando que estava atrasado para o trabalho. É isso mesmo, ele negou socorro porque tinha que sair para trabalhar como médico! Provavelmente o sujeito deve pensar que ele só é médico quando chega ao local de trabalho. Pois bem, Sr. T. pediu socorro a outro vizinho (que não é médico, e sim formado em Marketing) e o rapaz desesperado com o estado delibilitado dele, o levou para o hospital mais próximo de nossa casa. Horas depois, adivinhem só quem o Sr. T. encontra no mesmo hospital? Sim, o médico FDP! Constrangido porque o Sr. T. fez questão de apontá-lo para os filhos, ele tentou disfarçar a sua falta de caráter, mas era tarde demais. É claro que não acredito que o ato de negar socorro do vizinho-médico-FDP tenha influenciado no desfecho da vida do meu marido. Ele era uma pessoa muito especial para ficar à mercê de alguém tão mesquinho, mas me parece inacreditável que uma pessoa seja capaz de fazer algo assim e seguir vivendo tranquilamente. Dias depois, o médico FDP tentou falar comigo na garagem do prédio, mas eu o ignorei porque não teria condições de perdoá-lo tão cedo. Espero, sinceramente, que o médico FDP tenha tido algumas noites insones e que em algum momento, tenha se lembrado do seu juramento ou da declaração de Genebra: "eu, solenemente, juro consagrar minha vida a serviço da Humanidade".

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

O excêntrico Sr. T.

Sim, o Sr. T. tinha um visual excêntrico daquele impossível de esquecer. Vou tentar descrever, mas não sei se sou boa nisso. Para começar, ele usava os cabelos compridos trançados, mais ou menos abaixo do ombro. Eram trancinhas fininhas presas com elástico fino nas pontas. Ele levava cerca de seis horas no salão para destrançar os cabelos, lavar, hidratar e trançar de novo. Por isso mesmo ele tornou-se um grande amigo da dona do salão e das ajudantes que trabalhavam lá. O tempo que ele perdia no salão (uma vez por mês) rendia boas piadas entre nós sobre ser metrosexual ou não. Fora o visual cabelão + tranças + barba, a roupa era outro item curioso. Calça cargo camuflada (ou em tons cáqui, bege ou marrom), camisa de malha e botas. Sempre! Quando eu o conheci era pior, porque ele usava uma boina com uma estrela do PT e ficava a cara do Che Guevara. Diz a lenda que ele uma vez se encontrou com uma senhora que foi amiga do Che e a velhinha ficou muito emocionada porque o achou a cara do amigo perdido(se bem que não conheço outras testemunhas que possam confirmar a história). O auge da excentricidade (já vivendo comigo, é claro!) foi quando ele comprou uma espécie de calça de pescador camuflada, apesar dos meus protestos. Bom, ele vestiu a calça, uma bota (meu Deus!) e foi ao supermercado. Quando ele andava em direção à entrada, os taxistas que ficavam estacionados na entrada gritaram: TOPO GIGIO! O mais engraçado é que eu não estava presente, ele me contou o vexame quando chegou em casa e, obviamente, eu quase tive uma crise de tanto rir. Tentei dar o golpe de misericórdia: - Tá vendo? Eu não disse? Agora você vai desistir dessa calça, não é? Resposta:- Eu não! Eu fui até lá e fiquei amigo deles! Ohhhhh....

O primeiro e-mail

Sent: 30, Sunday June, 2002 11:06

Estou online novamente, vou te responder melhor mais tarde... mas sem dúvida a sua ousadia é o que mais me encanta no momento. E sei que posso encontrar muito mais preciosidades em uma "principesca".


Beijos
Eu


Meu amor partiu no dia 30 de junho de 2010, às 11:15h. Realmente, existem mais coisas entre o céu e a terra do que supõe a nossa vã filosofia... Eu sempre gostei de Shakespeare, ele nem tanto, mas considerando a sua formação em Direção Teatral, penso que ele devia ter razão.

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Não é mera coincidência

Eu poderia listar vários acontecimentos que indicam alguma coisa importante, embora eu não saiba exatamente o que é. Alguns me confortam, outros me entristecem ainda mais. Em alguns momentos concordo com Constantine, os desígnios divinos são uma espécie de piada cósmica da qual os humanos não tem a compreensão necessária para rir. Afinal, qual explicação poderíamos encontrar para alguém que depois de dois anos desempregado, consegue um emprego, cativa as pessoas e dois meses depois vai embora de forma tão repentina? Talvez seja a explicação do chefe do posto da Previdência Social, sem os dois últimos meses de contribuição do último emprego dele, eu não conseguirira o benefício para a nossa filha (outra história surreal que vou contar depois). É claro que eu me recuso a aceitar uma explicação tão pragmática, mas são apenas detalhes diante da minha descoberta mais significativa. Há alguns anos, meu amor imprimiu os nossos e-mails trocados desde o dia em que nos conhecemos, como um livro com o registro da nossa história. Folheando o livro no dia seguinte da sua partida, descobri que ele morreu exatamente na mesma data em que nos conhecemos: 30 de junho, exatamente oito anos depois do nosso primeiro encontro! Pensando que o nosso affair foi como um raio e desde o primeiro dia nunca mais deixamos de nos falar um só dia, percebo que encerramos um ciclo. Parece que a arquitetura das nossas vidas já estava definida, mas sempre vou considerar que a nossa história foi interrompida de forma prematura e desnecessária.

sábado, 14 de agosto de 2010

Hora de partir

Parece um clichê, mas é verdade, um dia você está fazendo planos, rindo, conversando e, no outro, tudo acabou. Sem possibilidade de argumentação, reclamações ou revisão. Não dá tempo para nada, só em filme americano as pessoas conseguem se despedir, pedir perdão, contar o segredo revelador... Não é assim na vida real, aqui não deixam você ver seu marido (mesmo que ele esteja piorando), não existe compaixão ou solidariedade. Quer dizer, existe sim, mas só depois da morte, quando já não adianta mais nada... Eu sempre penso em todos os cenários possíveis na minha vida com caminhos alternativos, mas nunca pensei nesta possibilidade. Revendo a nossa história, posso dizer que não era para terminar assim (ou, pelo menos, não devia terminar assim). Tentamos fazer um funeral discreto, com velório em João Pessoa e enterro rápido, mas foi impossível (tentamos vírgula, eu não tive condições sequer de pensar na palavra enterro). A notícia foi divulgada nas rádios, colocaram carro de som nas ruas e tudo fugiu ao controle. O velório foi no teatro da cidade, alunos e professores viajaram de Campina Grande para prestar uma última homenagem. E que homenagem! Meninos e meninas com 15 anos, abalados, tristes, que fizeram questão de se despedir do professor. Toda a tortura e o peso do momento se dissolveram nas palavras daqueles meninos, no discurso do Diretor de Ensino do IFET e na bela música cantada pela professora de Matemática que trouxe de suas raízes judias um belo poema para fazer a sua homenagem. O maior estresse, além de ouvir e ver pessoas indesejadas, foi a pressão para levar a minha filha ao enterro. Céus, ela não tem cinco anos ainda! Mais uma vez percebo o choque de culturas, aqui a presença de crianças nos enterros é uma prática comum e as pessoas insistiam que se ela não visse o pai iria ter problemas terríveis pensando que foi abandonada. Desde o primeiro momento em que conversei com ela, na mesma hora ela compreendeu que não o veria mais e chorou copiosamente até dormir.Sinceramente, não acredito que materializar uma cena tão terrível a ajudaria em alguma coisa. No meio do caos, ainda é preciso respeitar a crença dos outros e ser firme para que os outros respeitem a sua. Firme, enquanto tudo dentro de você parece desmoronar... Ao final de tudo, a tarefa mais difícil: voltar para casa e enfrentar a ausência e o vazio. O mais surpreendente é que seguimos vivendo, respirando, andando, comendo, porque não há mais o que fazer, é preciso viver.